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O jornalismo domesticado: como o Estado converteu a imprensa em órgão oficial

Imagem simbólica sobre o jornalismo domesticado, com livro “Journalism”, troféu, algemas e microfone, representando a submissão da imprensa ao poder estatal.

Em tempos de censura velada e suposta defesa da democracia, o governo brasileiro encontrou uma fórmula muito mais eficaz do que silenciar à força: premiar, contratar e patrocinar os que dizem o que o poder quer ouvir. A liberdade de imprensa, que deveria ser um pilar da sociedade democrática, foi substituída por um modelo de dependência institucionalizada, no qual redações inteiras se tornam apêndices do orçamento público.

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A imprensa como cliente do Estado

O atual governo Lula anunciou para 2025 uma previsão de R$ 3,5 bilhões em publicidade estatal. Isso inclui verbas para veículos tradicionais, campanhas em redes sociais, influenciadores e contratos com agências de comunicação. Não é coincidência: os mesmos jornais que antes criticavam ferozmente o governo — ou fingiam independência — hoje se tornaram seus principais defensores. Não porque foram convencidos, mas porque foram reconduzidos à folha de pagamento federal.

Com a retomada da Secom e o retorno da política de investimentos publicitários em grandes mídias, criou-se um ambiente no qual a crítica não é mais combatida — ela é simplesmente desincentivada. O governo não censura diretamente, mas também não precisa: basta cortar verbas, ignorar pautas ou privilegiar concorrentes alinhados. A linha editorial responde à fonte de receita, e a liberdade vira subproduto.

Prêmios, convênios e blindagem

Além do dinheiro direto, há outros instrumentos mais sutis — e igualmente eficazes. Jornalistas premiados por reportagens que fortalecem a agenda oficial ganham visibilidade, proteção institucional e espaço. Já aqueles que ousam discordar — como Paula Schmitt, censurada por expor contradições — são alvos de linchamento midiático ou ostracismo profissional. A pluralidade desaparece. O contraditório vira risco de carreira.

Parcerias com entidades como o TSE, convênios com agências estatais e projetos financiados com recursos públicos tornaram-se comuns. Reportagens “de interesse público” frequentemente coincidem com as prioridades do governo. Não se trata mais de informar, mas de doutrinar sob a capa da responsabilidade social.

A imprensa alinhada e a oposição invisível

A cobertura desigual salta aos olhos. Escândalos envolvendo aliados do governo desaparecem ou recebem tratamento brando. Já denúncias contra opositores ganham manchetes, análises e repercussão em cadeia. É a política editorial como ferramenta de manipulação, não de esclarecimento. A imprensa que deveria fiscalizar o poder agora o protege — com entusiasmo e verba pública.

O modelo lembra mais uma estatal disfarçada do que um jornalismo livre. Há veículos que vivem quase exclusivamente de verbas governamentais, seja via publicidade ou convênios. Sua sobrevivência depende do Estado — e isso compromete tudo.

Conclusão

Não há censura mais eficiente do que a voluntária. E não há submissão mais perversa do que aquela vendida como serviço público. O jornalismo domesticado é o novo normal: bajulador com crachá, crítico com medo e editor alinhado com a planilha da Secom.

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