Vivemos uma época paradoxal. Em nome da democracia, a liberdade de expressão é limitada. Em nome da proteção contra o “discurso de ódiscurso de \xf3dio”, o dissenso é criminalizado. Em nome da defesa da verdade, o pensamento único volta a dominar o espaço público. Este é o cerne da nova censura: ela não se apresenta como opressão, mas como cuidado. E exatamente por isso, é mais perigosa.
O novo rosto da censura
Historicamente, a censura era fácil de reconhecer: livros proibidos, jornais fechados, autores exilados. Hoje, ela atua de forma mais sutil. Não se queimam livros, mas perfis em redes sociais. Não se proíbe uma obra diretamente, mas se desmonetiza canais, se limita o alcance de conteúdo, se usa o algoritmo como mordaça.
A censura moderna vem vestida de toga, de jaleco, de terno tecnocrata. Ela fala em nome da “ciência”, da “segurança”, do “equilíbrio institucional”. Mas o resultado é o mesmo: o silenciamento de vozes incômodas, a exclusão de ideias fora do cardápio aprovado pelo consenso.
A naturalização do pensamento único
Um dos maiores triunfos do autoritarismo contemporâneo é fazer com que a censura pareça razoável. É a velha tática do “mas…”: “Sou a favor da liberdade de expressão, mas…”, seguida de alguma exceção que, na prática, anula o princípio. Assim, o pluralismo é substituído por um simulacro de diversidade, onde todos dizem a mesma coisa com palavras diferentes.
O resultado disso é uma homogeneização do debate público. Não há mais confronto de ideias, mas alinhamento à narrativa oficial. Quem questiona o establishment político, jurídico ou midiático é rotulado como “negacionista”, “extremista” ou “antidemocrático”.
O papel da imprensa e das instituições
Em vez de defender a liberdade como valor inegociável, grande parte da imprensa contemporânea atua como fiscal do discurso aceitável. Ao lado dela, instituições como tribunais superiores e organismos internacionais impõem parâmetros de verdade e civilidade que funcionam como cercas ideológicas.
O Supremo Tribunal Federal, por exemplo, tornou-se um ator ativo na regulação da linguagem. Inquéritos sobre “fake news” e “atos antidemocráticos” extrapolam a esfera penal e invadem o território da opinião. Além disso, plataformas digitais são convocadas a atuar como parceiras do controle estatal da informação.
Censura por algorítmo
O novo censor não tem rosto, nem assinatura. Ele é um algoritmo treinado para favorecer certos tipos de discurso e suprimir outros. Ele é o critério obscuro de “segurança da comunidade”. Ele é a remoção automática, o shadowban, a desmonetização.
Isso faz com que a censura seja ao mesmo tempo mais eficiente e mais difícil de contestar. Afinal, não há um censor humano a ser responsabilizado. Há apenas um “erro do sistema” ou uma “diretriz de uso” genérica.
A moralidade do silenciamento
A censura hoje se sustenta em uma moralidade artificial. Não se censura por imposição, mas por proteção. Protege-se o leitor da “desinformação”, protege-se o eleitor da “manipulação”, protege-se a sociedade de ideias consideradas perigosas. Mas quem define o que é perigoso? Quem decide o que pode ou não ser dito?
A resposta é sempre a mesma: os donos do poder. O que nos leva de volta ao problema central da liberdade: ela é sempre incômoda para quem deseja controlar.
Liberdade como direito, não concessão
O direito à liberdade de expressão não pode depender da aprovação alheia. A verdadeira liberdade inclui o direito de estar errado, de ser impopular, de dizer o que é incômodo. Como disse George Orwell: ouvir.
“Se a liberdade significa alguma coisa, será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem“
Hoje, esse direito está em xeque. O dissenso virou heresia. A pluralidade virou ameaça. E a democracia, ironicamente, tornou-se o pretexto para calar em vez de ouvir.
Conclusão: o que está em jogo
Não se trata apenas de redes sociais, opiniões polêmicas ou memes políticos. O que está em jogo é o futuro do debate público, da educação crítica, da democracia real. A nova censura, por sua forma difusa e seu discurso benevolente, representa um desafio inédito para as sociedades livres.
Resistir à censura não é defender o caos informativo. É defender o princípio de que a verdade não precisa de tutela estatal para existir. Que o conhecimento floresce do confronto, e não da imposição.
Por isso, o blog Poder & Mercado continuará sendo uma trincheira contra o pensamento único, em defesa da liberdade como valor inegociável.
Leia também:
- O Estado Contra a Liberdade Econômica
- Reforma Administrativa: O Brasil Que Paga Muito e Recebe Pouco
📩 Assine a nossa newsletter Radar Econômico e receba análises como esta diretamente no seu e-mail.
2 Comentários