A decisão que escancara o avanço institucional sobre a liberdade
O Supremo Tribunal Federal confirmou, em dezembro de 2023, a validade da resolução do TSE que concede poderes extraordinários para combater a chamada “desinformação” durante o período eleitoral. Segundo o próprio portal oficial do STF, a medida é apresentada como um mecanismo de defesa da democracia. Mas o que se apresenta como proteção, na prática, representa um avanço perigoso sobre os limites da liberdade de expressão — um avanço legitimado por aqueles que deveriam garanti-la.
A decisão escancara um problema central: quando o Estado se arroga o poder de definir o que é verdade e o que é desinformação, ele deixa de ser árbitro e passa a ser censor. Não há democracia onde o pensamento é policiado preventivamente. Como alerta o próprio texto do STF fonte: STF, essa autoridade pode ser exercida “de ofício”, sem provocação externa. Ou seja: censura antecipada, sem crime definido, sem contraditório, sem recurso imediato.
A liberdade, quando não é protegida para todos — especialmente os pequenos, os informais, os que pensam diferente —, torna-se apenas um privilégio seletivo, sujeito à interpretação dos poderosos. E isso, historicamente, é o início de todo autoritarismo.
A retórica da democracia como pretexto para controle
O que está sendo legitimado, com o aval do STF, é a institucionalização de uma fronteira difusa entre o que se considera “liberdade” e o que o Estado passa a chamar de “informação tóxica”. Como mostram reportagens recentes da CNN Brasil e do Correio do Povo, trata-se de um movimento deliberado de concentração de poder sob o pretexto de “defesa da democracia”.
Sob esse novo regime jurídico, o risco não é apenas o de censura direta, mas de autocensura difusa. A população, sem saber exatamente o que pode ou não ser dito, se silencia preventivamente. Cria-se um ambiente de medo argumentativo, onde a dúvida se transforma em infração e o discurso crítico é recodificado como ameaça à ordem democrática. O que se consolida, portanto, é uma nova forma de controle social — mais sofisticada, mais legalista, mas igualmente autoritária.
A desinformação existe, sim — mas o antídoto natural à desinformação é mais liberdade, mais debate, mais pluralidade de vozes. Quando o remédio vira censura, é sinal de que a doença está sendo usada como desculpa para outro tipo de infecção: a do poder sem limite.
A nova arquitetura do autoritarismo digital
Essa escalada jurídica não ocorre no vácuo. Vem acompanhada de um ecossistema ideológico, tecnológico e burocrático que transforma juízes em editores, tribunais em filtros da opinião pública e plataformas digitais em correias de transmissão da autoridade institucional. O que está sendo formatado é um novo modelo de governança da informação, onde a dúvida já não é um direito, mas um risco — e a crítica, um ato de desconfiança punível.
Vaza Toga e o abismo da confiança institucional
Não é coincidência que esse avanço ocorra num momento em que a confiança nas instituições está em queda livre, como mostra o caso ainda mal resolvido da Vaza Toga, revelando os bastidores da politização do Judiciário. Quanto mais poder concentra-se nas mãos de poucos, mais seletiva se torna a aplicação da justiça — e mais vulnerável a democracia se torna à manipulação institucional.
A erosão da legitimidade judicial não decorre apenas de decisões controversas, mas da percepção crescente de que o Judiciário abandonou a imparcialidade e assumiu o protagonismo político. Quando juízes se tornam atores centrais da disputa pública — com decisões monocráticas que interferem em eleições, em políticas públicas e na liberdade de expressão — o sistema perde o freio da moderação. O Supremo, que deveria ser o guardião das liberdades constitucionais, passa a atuar como legislador informal e censor institucional.
Essa distorção da função original do Judiciário alimenta a desconfiança e a resistência civil. O respeito às instituições depende de sua humildade funcional. Quando trocam a toga pela toga militante, os ministros não apenas traem o texto constitucional — eles colocam em risco o próprio contrato democrático.
Conclusão: censura com selo oficial
A liberdade de expressão, nesse cenário, já não é um princípio a ser defendido — é um obstáculo a ser contornado. E os que a defendem passam a ser tratados como cúmplices da desordem, extremistas ou negacionistas. A censura se traveste de regulação. E a proteção da democracia se torna seu pretexto mais perigoso.
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Referências:
- STF confirma validade de norma do TSE voltada ao combate à desinformação – Portal STF
- Supremo tem maioria para endossar superpoderes do TSE contra fake news – CNN Brasil
- Supremo endossa poderes do TSE contra fake news nas eleições – Correio do Povo
- STF julga constitucional resolução do TSE sobre desinformação eleitoral – Portal STF
- Vaza Toga – Wikipedia
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