O Brasil atravessa mais uma crise fiscal. Déficits crescentes, rombos no orçamento, aumento da dívida pública e anúncios de cortes em diversas áreas. A imprensa alerta para a “necessidade de ajuste”. O governo fala em responsabilidade. A população sente no bolso — preços mais altos, serviços precários, desemprego e impostos que não param de subir.
Mas, no meio desse cenário, há um grupo que não sofre cortes, não perde reajustes, não conhece crise. São os intocáveis da máquina pública. Os protegidos pelo Estado. Aqueles para quem o colapso fiscal é apenas uma manchete — nunca uma ameaça.
Este artigo vai expor quem são esses grupos, como se perpetuam, e por que o discurso da crise nunca chega para todos. Enquanto se fala em sacrifício coletivo, o privilégio estatal segue blindado.
A farsa da “crise para todos”
Toda vez que o governo anuncia contenção de gastos, o discurso é o mesmo: “É hora de todos contribuírem.” O problema é que o “todos” nunca inclui os mais privilegiados do sistema. Os cortes recaem sobre saúde, educação básica, segurança pública, subsídios ao transporte, pequenas iniciativas culturais ou auxílios pontuais.
Mas o topo da pirâmide — onde estão juízes, promotores, ministros, diretores de estatais, fundos partidários, fundos especiais do Judiciário e salários acima do teto — permanece intocado. Não há corte. Não há atraso. E quando há crítica, a resposta é jurídica: “direito adquirido”.
O Brasil vive sob um sistema onde o privilégio é protegido pela legalidade, enquanto a liberdade é vista como instabilidade.
O poder blindado: Judiciário e altos salários públicos
Entre os maiores intocáveis da crise estão os membros do Judiciário. Juízes, desembargadores, ministros de cortes superiores e seus gabinetes. Os salários ultrapassam o teto constitucional, os auxílios são generosos (moradia, alimentação, transporte, livro, creche) e os aumentos são regulares — ainda que a inflação corroa o salário do cidadão comum.
Enquanto isso, setores essenciais do serviço público sofrem com falta de estrutura e pessoal. Mas o orçamento do Judiciário segue crescendo. Não por eficiência — mas por força política e independência orçamentária.
Essa realidade foi evidenciada no artigo A elite fiscal: como funcionários públicos de alto escalão sobrevivem à crise, onde mostramos que não existe crise uniforme. Existe austeridade seletiva.
Fundos partidários e o orçamento imexível da política
Outro setor que não conhece cortes é o da política partidária. O fundo eleitoral e o fundo partidário são abastecidos com bilhões em recursos públicos, independentemente do cenário fiscal. A cada ano, novas discussões são abertas para aumentar esses repasses — inclusive em meio à pandemia, à estagnação econômica e ao estouro do teto de gastos.
Os partidos não precisam prestar contas ao cidadão, não dependem de doações voluntárias e não precisam entregar resultados. Vivem de repasses automáticos, garantidos por lei. Enquanto o empreendedor informal luta para pagar o MEI, partidos recebem quantias milionárias por deputado eleito.
E o discurso permanece: é para garantir a democracia.
Estatais deficitárias com salários superavitários
O Brasil mantém estatais que operam com prejuízo há décadas — mas continuam existindo. Não por necessidade econômica, mas por conveniência política. Essas empresas abrigam aliados, distribuem cargos comissionados, movimentam contratos bilionários e servem como abrigo de privilégio travestido de função social.
A folha de pagamento dessas estatais revela salários muito acima da média do setor privado, bônus generosos e estabilidade funcional. Quando se fala em reforma administrativa, essas estruturas são poupadas. Quando se fala em “eficiência”, ela é sempre cobrada do pequeno empresário — nunca da máquina pública.
O funcionalismo blindado por lei
Existem servidores públicos que trabalham duro, são mal pagos e sofrem com falta de condições. Mas o alto escalão do funcionalismo não está nesse grupo. Com salários iniciais acima de R$ 20 mil, progressões automáticas, férias prolongadas, licenças remuneradas e aposentadoria integral, esse grupo representa a elite estatal que vive imune à crise.
Qualquer tentativa de reforma é combatida com discursos jurídicos, greves preventivas e ação parlamentar coordenada. A máquina se protege — com as leis que ela mesma escreve e interpreta.
Quem paga a conta: o contribuinte órfão
Enquanto esses grupos mantêm seus privilégios, quem paga a conta é o contribuinte comum. O cidadão que não tem estabilidade, não tem fundo eleitoral, não tem bônus, nem auxílio. Que paga impostos cada vez mais altos, enfrenta burocracia, sofre com serviços ruins — e ainda é acusado de “sonegar” quando tenta sobreviver fora da formalidade opressiva.
O artigo O Novo Imposto Invisível: Como a Inflação Corrói o Salário e Blindam os Privilégios mostra como até a moeda é manipulada para proteger quem está no topo. A inflação, o endividamento público e a desvalorização do real são políticas de concentração de poder — não acidentes econômicos.
A política do privilégio não é exceção. É regra.
O sistema não está em crise. Ele está funcionando exatamente como foi desenhado: para proteger quem está dentro, e cobrar mais de quem está fora. A máquina pública brasileira é um castelo jurídico-fiscal cercado por um fosso de leis, encargos e burocracia. Quem entra, não sai. Quem está fora, não entra.
Não há reforma real enquanto os verdadeiros centros de privilégio forem poupados. Não há equilíbrio fiscal enquanto o topo for blindado e a base for sacrificada.
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