Dizem que falta dinheiro. Mas o que falta mesmo é limite.
Todo ano, a narrativa se repete: o orçamento é curto, o país é pobre, o cobertor é curto. E como sempre, o ajuste recai sobre quem trabalha, empreende ou consome. Mas quando olhamos os números — os gastos com privilégios institucionais, auxílios parlamentares, fundões eleitorais, passagens, diárias, verbas secretas — a imagem é outra: o Estado brasileiro não é pobre. Ele é seletivamente generoso.
Falta para uns, sobra para outros
Enquanto milhões vivem com menos de R$ 2.000 por mês, senadores recebem R$ 44 mil líquidos, com direito a auxílio-moradia mesmo possuindo imóvel. Enquanto pequenos empresários fecham por excesso de impostos, deputados criam frentes parlamentares para defender setores privilegiados. Enquanto o SUS sofre colapsos, ministros voam em jatinhos da FAB para compromissos particulares.
Não falta recurso — o que falta é vontade de romper com a lógica que perpetua desigualdades institucionais em nome da governabilidade, da tradição ou da conveniência.
O Brasil da austeridade seletiva
Quando se fala em cortar gastos, as propostas recaem sobre:
- Benefícios sociais (para os mais pobres)
- Investimento em infraestrutura (para o país crescer)
- Cortes em serviços básicos (para “equilibrar” as contas)
Mas ninguém propõe cortar:
- Verbas de gabinete
- Fundos partidários
- Cargos de livre nomeação
- Estatais com prejuízo crônico
Porque isso afetaria o funcionamento da engrenagem política. E, como todos sabem, no Brasil, a política é intocável.
O discurso da pobreza é só para você
A elite estatal criou uma blindagem retórica: “não dá pra fazer mais com menos” — a menos que esse “menos” seja você.
E é por isso que o Brasil continua sendo um país “pobre” onde políticos viajam em classe executiva, gastam R$ 200 mil com gráfica e aprovam aumentos salariais acima da inflação — enquanto o povo raciona arroz e remédio.